Cerco a Nicéia
E assim o Duque Godofredo foi primeiro a Nicomédia,
juntamente com Tancredo e todo o resto, e lá estiveram por três dias.
O Duque, na verdade, vendo que não havia estrada
aberta pela qual ele poderia conduzir seu exército para a cidade de Nicéia,
pois um exército tão numeroso não poderia passar pelo caminho por onde os
outros haviam passado antes, enviou à frente três mil homens com machados e
espadas para cortar e abrir esta estrada, para que ficasse aberta até a cidade
de Nicéia. Eles cortaram
essa estrada por uma montanha muito grande e estreita, e fixaram cruzes de
ferro e madeira ao longo do caminho para que os peregrinos identificassem o
caminho.
Enquanto isso, nós chegamos a Nicéia, que é a
capital de toda a Romênia, no quarto dia, um dia antes da Nona de Maio, e lá
acamparam. No entanto, antes da chegada de Boemundo, tal era a escassez de pão
entre nós que um pão era vendido por vinte ou trinta denários.
Depois da chegada do
ilustre Boemundo, este ordenou que o maior número de provisões possível fosse
trazido por mar, que chegaram por duas vias ao mesmo tempo, por terra e por
mar, e houve a maior abundância em todo o exército de Cristo. Além disso, no dia da Ascensão
do Senhor, começamos o ataque à cidade por todos os lados, e a construção de
máquinas de madeira e torres de madeira, com os quais pudéssemos destruir as
torres nas muralhas.
Armas de Assalto
Atacamos a cidade com tanta coragem e ferocidade
que chegamos a arruinar sua própria muralha. Os
turcos que estavam na cidade, horda de bárbaros que eram, enviaram mensagens
para outros que tinham vindo dar-lhes auxílio.
Eis o que dizia a mensagem: que eles poderiam
aproximar-se da cidade com coragem e seguros, e entrar pela porta do meio, pois
desse lado ninguém iria se opor a eles ou molestá-los. Este portão foi cercado naquele
mesmo dia ‒ o sábado depois da Ascensão do Senhor ‒ pelo Conde de St. Gilles e
pelo Bispo de Puy.
O Conde, aproximando-se por outro lado, foi
protegido por poder divino, e com seu poderosíssimo exército se glorificava por
sua força terrestre.
E assim ele encontrou os Turcos vindos aqui contra
nós. Armados de todos os lados com o sinal da cruz, ele correu em cima deles
violentamente e venceu-os. Eles
puseram-se em fuga e a maioria deles foi morta. Novamente eles voltaram,
reforçados por outros, alegres e exultantes, seguros do (resultado) da batalha,
e trazendo consigo as cordas com as quais nos levariam atados até Chorosan.
Além disso, alegres começaram a descer a crista da
montanha, a uma curta distância. Todos que desceram lá ficaram com suas cabeças
cortadas nas mãos de nossos homens; além disso, nossos homens lançavam as
cabeças dos mortos longe para dentro da cidade, para que eles (os turcos)
pudessem se aterrorizar com isso. Em seguida, o Conde de St. Gilles e o Bispo de Puy
reuniram-se em conselho a respeito de como eles poderiam ter danificado certa
torre que estava em frente a suas tendas.
Foram designados homens para fazer a escavação,
com besteiros [relat. besta] e arqueiros para defendê-los de todos os lados.
Então, eles cavaram até as fundações da muralha e assentaram vigas de madeira
sob ela, e em seguida atearam fogo a ela.
No entanto, a noite tinha chegado, a torre já
tinha caído no meio da noite, e porque era noite não poderiam lutar com o
inimigo. Com efeito, durante a noite os turcos
apressadamente construíram e restauraram tão solidamente a muralha, que quando
amanheceu ninguém poderia molestá-los daquele lado.
Agora, o Conde da Normandia veio o Conde Estêvão e
muitos outros, e, finalmente, Roger de Barneville. Por fim, Boemundo, bem na
frente do exército, sitiou a cidade. Ao seu lado estava Tancredo, depois dele o
Duque Godofredo, o Conde de St. Gilles, perto de quem estava o Bispo de Puy.
De tal maneira foi sitiada por terra que ninguém
se atrevia a entrar ou sair. Lá todas as nossas forças foram reunidas em um só
corpo, e quem poderia ter contado um tão grande exército de Cristo? Penso que
ninguém jamais viu ou verá cavaleiros tão distintos! No entanto, havia um grande
lago de um lado da cidade, no qual os Turcos enviavam seus navios para trazerem
forragem, madeira, e muitas outras coisas.
Então nossos líderes reuniram-se em conselho e
enviaram mensageiros à Constantinopla para pedir ao Imperador que mandasse
navios para Civitote, onde há um forte, e que ele devia mandar trazer bois para
arrastar os navios pelas montanhas e pelos bosques, até que se aproximassem do
lago. Isso foi feito imediatamente, e ele enviou seus Turcopolos com eles. Eles não quiseram colocar os barcos no lago no mesmo
dia em que eles foram trazidos, mas sob o manto da noite eles lançaram-nos no
lago. (Os barcos foram) enchidos com Turcopolos bem enfeitados com armas.
Turcopolo
Além disso, nos primeiros albores da manhã, os
navios colocaram-se em boa ordem e apressaram-se através do lago contra a
cidade. Os turcos maravilharam-se ao vê-los, sem saber se eram tripulados por
seus próprios exércitos ou pelo do Imperador.
No entanto, quando reconheceram que era o exército do Imperador, ficaram
amedrontados até a morte, chorando e lamentando, e os Francos se alegraram e
deram glória a Deus.
Os turcos, além disso, vendo que não poderiam ter
nenhum outro auxílio de seus exércitos, enviaram uma mensagem ao Imperador, de
que estariam dispostos a entregar a cidade, se lhes permitissem ir embora com
suas esposas e filhos e todos os seus bens.
Então o Imperador, cheio de vaidade e maus
pensamentos, mandou que eles partissem impunes, sem nenhum medo, e que fossem
levados até ele em Constantinopla, com grande certeza (de segurança). Destes cuidava ele zelosamente, de modo que
os tinha preparado contra qualquer dano ou obstáculo da parte dos Francos.
Estávamos empenhados naquele cerco há sete semanas
e três dias. Muitos dos nossos homens lá receberam o martírio, e, contentes e
jubilosos, entregaram suas almas felizes a Deus. Muitos dos muito pobres
morreram de fome pelo Nome de Cristo, e estes levaram triunfalmente para o Céu
suas vestes do martírio clamando em uma voz, “Vingai, Senhor, nosso sangue que
foi derramado por Vós, que sois bendito e digno de louvor por todo o sempre.
Amém”.
Enquanto isso, após a cidade ter-se rendido e os
turcos conduzidos a Constantinopla, o Imperador cada vez mais alegre porque a
cidade tinha sido entregue ao seu poder, ordenou que uma enorme distribuição de
esmolas fosse feita aos nossos pobres.
0 Comentários